segunda-feira, 6 de abril de 2020

CARTA ABERTA ÁS COMUNIDADES ESCOLARES: RESPONSÁVEIS, ESTUDANTES, PROFESSORES E DIREÇÕES – SOBRE AULAS ONLINE E SUAS CONSEQUÊNCIAS IMEDIATAS

SINPRO Friburgo - 06/04/2020

Cumprindo com seu papel de representar professores e professoras das escolas particulares de Nova Friburgo e região, e reafirmando seu compromisso com a educação de qualidade a que todo estudante tem direito, o SINPRO (SINDICATO DE PROFESSORES) dirige-se a toda a comunidade escolar dos municípios sob sua alçada e especialmente às direções de escola e aos responsáveis para REPUDIAR frontalmente a imposição abusiva do teletrabalho que já vem desgastando grande parte da categoria e da relação ensino-aprendizagem, especialmente no que se refere às aulas “ao vivo”.

Já na primeira semana de “ensino” virtual e excepcional aos níveis Fundamental e Médio, são diversos os relatos e as denúncias de superexploração do magistério, bem como dificuldades em garantir um aprendizado satisfatório aos alunos e alunas da rede privada. Em geral, conforme já exposto pelo SINPRO em notas anteriores, a simples implementação do ensino à distância já traria enormes desafios à rede (garantia de acesso a todos, qualificação para as novas funções, preparação excepcional de materiais etc) mas os problemas se agravaram e multiplicaram de forma acelerada nos dias seguintes, destacando uma vez mais o fato de não haver qualquer debate acerca do projeto dentro das escolas. Em suma: responsáveis, profissionais de educação, professores e alunos não têm sido sequer consultados acerca das medidas implementadas, sendo reféns de arbitrariedades que acabam por cristalizar absurdos dos mais variados.

A título de exemplo, há unidades em que o professor se vê obrigado a prestar serviços em tempo real, usando da própria estrutura (celular, computador, banda larga, local de gravação adaptado) e submetido à presença nem sempre positiva de uma verdadeira plateia que vai para muito além do aluno a quem se dirige a aula, situação que atenta contra a liberdade de cátedra do magistério e expõe os professores e sua imagem a julgamentos descontextualizados do que ele ensina. Em tempos de perseguição explícita ao conhecimento – inclusive científico – abre-se a possibilidade de extremismos e críticas desmensuradas e agressivas a profissionais que por vezes são obrigados a deixar de lado os cuidados de que necessita sua família (crianças pequenas, idosos, convalescentes etc.) para produzir conteúdos pirotécnicos dentro de uma pretensa e inexistente normalidade enquanto o próprio noticiário e as autoridades afirmam que o país vive "tempos de guerra”. Em outros casos extremos, professores são obrigados a gravar mais de uma vez o mesmo material para satisfazer os patrões e no limite do absurdo há instituições ameaçando condicionar o pagamento dos trabalhadores à quantidade de aulas que ele oferecer, e tudo isso, repetimos, sem qualquer consulta ao corpo de funcionários e alunos, além dos outros empecilhos já mencionados.

Como já destacamos em outras oportunidades, o SINPRO não se opõe ao debate sobre medidas excepcionais de educação domiciliar em meio à atual pandemia e compreende as dificuldades e surpresas de todo o processo, mas a imposição de videoaulas, especialmente as que acontecem “em tempo real”, representam um arranjo descompromissado com a realidade do país e mesmo da rede privada, posto que nela, observando as próprias variações de mensalidade, há uma enorme diversidade sócio-cultural que fica à margem do mundo tecnológico uniforme que se faria necessário para um ensino verdadeiramente plural, democrático e qualificado em todo o Brasil.

Compreendemos acima de tudo a preocupação de responsáveis, mães, pais, e alunos em geral quanto ao seu direito de receber e participar do ensino como um todo, mas ressaltamos que a imposição apressada de modelos prontos e não experimentados resulta em inevitável estranhamento de todas as partes, afetando a qualidade das “aulas” e tornando complexo o “contato” entre os atores do processo, haja visto que a suposta “proximidade” desejada torna-se apenas mecânica, fria e impessoal como a tela de um smartphone. Educar só é possível em espaços onde TODOS OS ENVOLVIDOS se façam ouvir, e nesse sentido, queremos propor que as escolas abram espaço, ainda que virtual, para discussão e troca de ideias, garantindo à comunidade escolar o atendimento de suas demandas, sugestões, críticas, pedidos, elogios e ajustes sem os quais o ato de ensinar vira simples mercadoria a ser entregue num endereço virtual.

Apesar de algumas poucas exceções onde as atividades propostas não tem sido impositivas, o contexto geral do município é tenebroso, não sendo exagero afirmar que a precipitação da educação à distância “ao vivo e em cores” tem jogado diversos professores e professoras em um cenário de verdadeiro pesadelo, com sobrecarga de trabalho virtual e prejuízos à saúde mental e emocional da categoria, esta já bastante afetada, como toda a população, pelo contexto da COVID-19. Também diversos responsáveis (com suas preocupações profissionais, FINANCEIRAS e estruturais) e os alunos (inseguros quanto ao calendário escolar, à reposição de aulas no futuro e à possibilidade de não aprendizado na nova modalidade) se vêem desorientados em muitos aspectos educacionais que poderiam estar mais adequados ou esclarecidos mediante o diálogo que estamos novamente requerendo, e por isso esta carta aberta se dirige também a eles. Educar só é possível em espaços onde TODOS TENHAM VOZ... E OUVIDOS!

No que se refere a questões trabalhistas, por exemplo, o SINPRO tem obrigação de questionar: como será contabilizada a quantidade de trabalho que se faz necessária para uma videoaula? E para as atividades que não demandam vídeo mas exigem um tempo extraordinário e não convencional ou mesmo não acordado? Qual a situação dos direitos de imagem dos professores que são obrigados a gravar suas aulas? Antes disso: é razoável essa imposição agora e dessa maneira? Em caso de assédio ou desrespeito frente a qualquer situação acadêmica, qual o suporte garantido pela escola a seus profissionais? É razoável obrigar que o profissional tenha aparelho, banda larga e “estúdio de gravação” em casa? E aqueles professores ou alunos que não conseguirem? Serão descontados em seus salários ou prejudicados em seus estudos, respectivamente? Qual o suporte tecnológico oferecido ao desgaste de seus aparelhos e ao custo/pacote de dados de sua internet? Em caso de pessoas que tenham crianças pequenas ou idoso sob seus cuidados de isolamento social, como proceder em meio a imprevistos? Eles serão aceitos sem maiores questionamentos ou constrangimentos? Enfim, só no campo trabalhista já são muitas questões (embora não todas!), às quais se somam outras problematizações trazidas anteriormente no texto e que se estendem a toda a comunidade e suas demandas, cujo espaço de serem postas simplesmente não existiu.

Finalizando por agora e desde já contribuindo para o debate fraterno que reivindicamos, o SINPRO enumera algumas das preocupações mais básicas que surgiram já nos primeiros dias, e convida todos e todas a elaborar outros questionamentos e requerer junto às escolas maior transparência e garantias ao conjunto da sociedade. O ato de educar é compromisso desse conjunto, não podendo em hipótese alguma ser maquiado com tecnologias que devem sim ser utilizadas de forma complementar, mas nunca apresentadas como solução arbitrária em meio a um cenário de instabilidade e preocupações como o que se observa nesse momento difícil do nosso país.

Cumprimentando cordialmente a todos e todas, apelamos à reflexão dos envolvidos e solicitamos: DIÁLOGO JÁ, pois educação não é mercadoria, professor não é youtuber e estudante não é depósito de vídeo-aula! Ou se discute o ensino como um todo e o tempo todo, ou ele simplesmente não cumprirá com seu papel.

Assinado: Direção Colegiada do Sinpro NF